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domingo, janeiro 27, 2008

Nuvem cinza no céu anil

E no céu de anil apareceu uma nuvem cinza.
E ela roubou a cor do dia.
E da nuvem cinza jorrou água, como há muito tempo não se via.

E tanta chuva encharcou quem ficou ali e não quis correr e se esconder.

E a nuvem veio sem pressa de ir embora.

E ela veio para provar que dias azuis não duram para sempre.
Ou apenas para provar que eles não são completamente azuis.
O céu é que é muito grande.

Caixas de nostalgia

Mudar de casa traz além de novas expectativas de vida um mundo de recordações que vivemos até hoje.

Em cada gaveta, em cada caixa, um monte de lembranças. De tempos idos, quando amávamos com o mesmo desespero com que chorávamos nossas desilusões. De épocas em que nossos dias se dividiam entre estudar e sair para a rua encontrar os amigos.

Amigos que foram os melhores durante anos, meses, dias. Amigos que ainda são os melhores. Amigos que mesmo que o tempo tenha levado pra longe, quando encontramos, é como se nunca tivessemos ficado sem contato.

São fotos, são bilhetes, são agendas. Um mundo de registros que nos confirma o quanto fomos felizes. E que precisavamos de muito pouco para nos sentirmos assim.

Ah, quanta saudade...

sábado, janeiro 19, 2008

Seguro desconforto

Com medo de me perder, me contive.
E percebi, para minha surpresa, que desse jeito mais perdida fiquei.
Sem caminho e sem solução.
Perdi o trem que me levaria talvez para um feliz lugar desconhecido
Deixei passar a oportunidade de me deixar levar
Fiquei aqui, sentada, com a minha segurança ignorante,
Apoiando os braços numa mala de saudade.

segunda-feira, janeiro 14, 2008

Uma só

Me empresta uma palavra?

A sensação boa que me causas me deixa sem nenhuma
Fico aqui, sentada, olhando a página em branco
Esperando que a caneta traduza tudo aquilo que queria dizer
Corro os olhos para o alto em busca de algo que não consigo explicar
Busco no físico algo que não verei nunca
Por favor, entenda meu silêncio e não o recrimine
Pois o que quero partilhar é tudo aquilo que sinto
Que está aqui guardado
Dentro desta lata velha que também ouso chamar de coração.

domingo, janeiro 13, 2008

Sobre o silêncio

Quanta coisa pode ser escondida pelo simples fato de não existirem palavras?

Nos calamos com freqüência quando não temos as respostas certas ou apenas quando não temos coragem o suficiente para proferi-las. E não somente porque a verdade possa doer, porque a tememos mesmo quando ela revela grandes coisas boas.

Talvez porque depois que as palavras são ditas elas concretizam pensamentos e não podem ser apagadas ou modificadas. Pode ser porque nunca sabemos com antecedência a reação de quem as receberá. Ou pode ser apenas porque mesmo quando imaginamos que as dominamos, elas fogem de nós quando mais precisamos.

O fato é que, por outro lado, o silêncio também pode ser interpretado de muitas formas. E se não ousamos falar, por medo, apreensão ou timidez, estamos deixando que ele fale por nós. E sem saber se ele será um bom interlocutor. Se não dominamos as palavras, dominamos muito menos sua ausência.

Sinais de vida

Coração prisioneiro nas mãos de um gigante
Pequenino
Pulsa devagar
Para que o monstro não sinta
E, percebendo que ainda está vivo,
Aperte com força até parar.

domingo, janeiro 06, 2008

Desilusões

Há sempre um pouco, ou muito, de ilusão no que é sonho. São sempre apostas, que tanto podem se transformar em alegres realidades ou desalentadoras lembranças.

Quanto mais se investe, maior o risco. E nem é preciso tanto esforço para colocar muitos créditos naquilo que imaginamos que queremos, seremos ou teremos... A capacidade de imaginar nos deixa sempre à mercê do imprevísivel.

Às vezes, meia dúzia de palavras matam a esperança. Destroem construções, liquifazem em lágrimas projeções. Às vezes, nem tantas.

sábado, janeiro 05, 2008

Para quem na ausência me acompanha

Nesta tua falta sobra tanta ausência que eu me pergunto até onde vai a saudade e o quanto disso tudo é apenas costume.

Nas palavras que uso e só você entende, nas caretas que faço e te divertem e nas lembranças que vêm e voltam a todo momento sinto que você passou a fazer muito mais parte da minha vida do que eu supunha.

Penso que não adianta suprimir o que sinto e tentar evitar que isto aconteça. Já sei e posso prever que novas cicatrizes virão. Concluo, enfim, que se tudo é tão breve e passageiro, não faz sentido que coisa alguma, ainda mais quando faz bem, seja impedida de ser o que deve ser.

quarta-feira, janeiro 02, 2008

Metades de mim

Sou metade sol, metade lua. Parte de mim é fogo e outra parte é água. Um pouco de fel e um pouco de mel, um lado de bondade e outro de pleno veneno. Sou palavra e sou silêncio, sou céu e sou chão. Sou riso e sou pranto, sou imagem sem som e sou canto.

Sou duas e cada uma anda só, porque não conseguem existir na presença da outra. Andam sozinhas porque mesmo juntas estão solitárias. Não se dão as mãos porque ambas oferecem a palma para cima. Não conversam porque não se entendem, não se olham porque não se aceitam.

Perderam a vida assim, duelando silenciosamente. Fingindo que a outra não existia, ignorando o que a outra sentia e desprezando o que a outra fazia.

E no dia em que tentarem se encontrar, nada mais poderá ser feito. Não há de existir nenhuma ponte que as ligue, o abismo vai ser tão grande que só poderão ouvir o eco de sua própria voz chamando.

terça-feira, janeiro 01, 2008

Liberte-se

Faça com que seus dias sejam diferentes. Invente uma coisa nova para fazer em cada um deles. Ouse arriscar. Coloque aquela cor de blusa que você não tem coragem. Ou o chapéu que você acha que fará as pessoas rirem de você. Que riam. Melhor fazer as pessoas felizes do que tristes. Saia sozinho para um passeio onde vai haver muita gente e conheça novas pessoas, faça novos amigos. Converse com pessoas nos pontos de ônibus. No elevador. No mercado, peça ajuda para escolher uma fruta para quem está na mesma banca que você, apenas pelo prazer de puxar conversa. Fale com o porteiro, com o cobrador do ônibus, com o garçom. Pergunte como vai a vida e ouça, atentamente. Faça coisas que geralmente você não faz porque alguém pode te achar idiota se o vir fazendo. Corra para não perder o ônibus, lamba os dedos, ria alto, tire fotos com as réplicas em papelão de personagens nos cinemas, use listras e bolinhas simultaneamente. Não encha sua agenda apenas de coisas sérias, mesmo que isso te faça dormir um pouco menos do que gostaria. Reserve muito tempo para seus amigos. Não fure compromissos com eles por sono ou cansaço. Mande cartões de aniversário. Por correio. Ande de bicicleta, faça passeios a pé. Ande por ruas desconhecidas, se deixe perder em algum lugar. Conheça lugares diferentes. Se não der para ser cidades novas, que sejam novos botecos, novas praças, novos cinemas, novos mercados. Brinque de amarelinha. De esconde-esconde. De brincadeiras de criança.

Está em nossas mãos fazer cada dia deste ano melhor do que qualquer outro que já vivemos. Liberte-se dos pré-conceitos, dos idealismos, dos cabrestos e ouse. Ouse sempre mais.

Um 2008 usado de tão ousado para todos nós.